sexta-feira, 8 de julho de 2011

Os herdeiros


Um comentarista assíduo do Blog do Noblat fez noutro dia uma pergunta instigante:
 
Afinal de contas, as capitanias hereditárias já foram extintas no Brasil ou não?
Bem, extintas foram, em 1759, e por ordem de ninguém menos que o todo poderoso Marquês de Pombal.
Sempre se fala que os donatários eram nobres amigos do rei. É verdade. Mas não creio que esse fosse um erro grave em meados do século XVI. O gravíssimo foi a qualificação: hereditárias...
Aí é que a porca torceu o rabo. E torce.
Nem o advento do Governo-Geral, em 1548, como centro de unidade governamental, nos salvou dessa herança. E olha que D. João III ao criar os cargos de Governador-Geral, Ouvidor Geral, Provedor-Mor da Fazenda e Capitão-Mor da Costa, criou também minuciosos códigos administrativos, os chamados Regimentos que são, para muitos historiadores, a primeira Constituição do Brasil.
De falta de códigos não podemos nos queixar. Temos muitos, todos muito rígidos. Mas o hereditário, essa palavrinha fatal, anarquizou com todos eles.
Vejamos: os donatários tinham como missão colonizar, proteger e administrar o território. Por outro lado, podiam explorar os recursos naturais: madeira, animais, minérios.
Podiam e continuam podendo: seus herdeiros exploram os recursos naturais e mais todas as novidades que os séculos seguintes trouxeram, que não foram poucas.
E, como brinde pelo trabalho hercúleo, os herdeiros herdaram o poder político.
Os jornais impressos nem sempre têm espaço para as pequenas notas, papel custa caro e as notícias mais ribombantes têm a preferência.
As estrepitosas, como o sigilo no que vai se gastar nas obras para atender aos ditames da FIFA, têm espaço, mas logo somem do cartaz. Outras aparecem em seu lugar e somos diariamente agredidos por novas igualmente ferozes. Que, mal ou bem, acabam arrancando alguma solução: a opinião pública, graças à Imprensa, anda muito atilada.
Mas as notícias de uma ou duas linhas, tipo os pundonores do senador Blairo Maggi, ou as tristes, como as explicações para a decadência de um de nossos maiores orgulhos, a TV Cultura de São Paulo, essas expiram diante do estouro das outras.
Pena. São elas que têm a marca, o contraste do herdeiro do donatário. Porque são quase imutáveis. Trocam de cor e som, só isso. Constatam, apenasmente (para honrar o grande representante da classe política brasileira, o saudoso Odorico Paraguaçu), o doloroso registro do que disse acima.
São a prova que o Brasil é deles: nós, o povo, somos meros coadjuvantes. 

Extraído de http://oglobo.globo.com/pais/noblat/. Acesso em 08/07/2011 às 18:42

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